Sobre o autor Sobre o autor
Pé de Buceta Buceta Monstro Casa das Bucetas Inferno de Bucetas: Paraíso
A doce arte de Nana Caribenha
Mesmo em noite quente há coisas piores que cerveja choca
Mergulhando no ar
Deep into the Air
Blog Spectro Editora
Bukowski - Vida Desalmada
Próximo capítulo

Capítulo anterior

16


(entra o bufão)

Bufão: Então, resume-se assim tudo! Um pouco de falta de graça e de humor, uma azia estomacal temperando o tumor. Será nos rins a ferida? Ou é o fígado que se esvai já na bebida? Tempere tudo e lá está: ácido, azedo e sem graça, ele, o cotidiano!

Ah, mas que então não, mil vezes não! Surge o herói pra reparação. Sujo covarde, herege, seu sangue se esvai na terra bege. Levanta. Levanta, ó bastardo. Finge-te humano. Mas vejam todos, venham e vejam só que patética figura, segurando o isqueiro vazio em uma mão e na boca o cigarro suspenso no ar, esperando por fogo. Suspenso e amassado, infumável, mas que no entanto lá está ele, o herói, bêbado e insano, fitando o ar vazio e tentando fumá-lo apagado.

A garrafa de uísque. É claro, não podia faltar nada, uma garrafa vazia como efeito de cena, para preencher a outra mão do herói. Ambas mãos ocupadas agora, o uísque e o isqueiro, formam um belo par, sem dúvida. Ambos vazios assim como a cabeça e o olhar do protagonista.

Talvez devêssemos abri-la. Sim farei isso, buscarei um machado e partirei eu mesmo o crânio em dois. Ó, mas que horror, mas que tédio vê-lo ali, assim, parado, inerte como está já há mais de uma hora. Talvez sonhe com uma meretriz... nesse caso seria prudente dispensar o público antes de degolar-lhe e desvendar-lhe o crânio, pois tais pensamentos chocariam as senhoras e mancharia a imagem do herói. Não, não, nada disso, por certo pensa em alguma coleguinha de escola, alguma amiguinha sua cujos primeiros sinais da puberdade já estão agora prontamente finalizados e exibidos faceiramente ao mundo. Sim, notei que uma gota de saliva acabou de escapulir-lhe dos lábios. Há de ser isso, uma colega de classe ou alguma professora mais nova cujas roupas apertadas fizeram nosso herói suar e sonhar durante a aula.

Vede! Vede! Vejam todos! Ele se move. Acabou de lentamente inclinar a cabeça pro lado direito, não viram. Aposto como agora irá começar a mexer lentamente a cabeça e gesticular com a mão direita, que segura o isqueiro. Ao menos não se masturba. Ou será que é isso que pretende? Masturbar-se em público até que a polícia o prenda ou apanhe de novo da multidão que está no bar do qual acaba de ser expulso? É uma decisão, é isso. Nosso herói tenta certamente tomar uma decisão. Será sobre mulher ou bebida? Pois se for qualquer um dos dois é perda de tempo, nunca conseguirá tomar nenhuma decisão na vida quando qualquer um dos dois assuntos estiverem envolvidos.

Não crêes em mim. Vede, vede. Enquanto pinga outra gota de saliva do queixo até o chão, vede como tanto no passado ou no futuro será incapaz de decisão alguma, e que por isso nunca conseguirá ficar muito tempo longe de nenhum dos dois. A diferença é que enquanto as mulheres sairão da sua vida a bebida sempre o acompanhará, esteja aonde e quando estiver.

Ó, dá-me o machado. Acabarei de uma vez por todas com esse suplício que não anda. Essa coisa empacada e abominável que repugna a condição de humano.

   
  Topo da página